quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

TIAGO MESQUITA: COLAR CERVICAL

«A política sempre me meteu nojo. Não o acto ou exercício em si, que alguns ainda insistem em apelidar de nobre, mas a maioria dos seus intervenientes e agentes. Cheguei ao bonito ano de 2012 e a única certeza que tenho é que grande parte do conjunto de pessoas que (se) servem (d) este país através de cargos políticos devia usar um colar cervical. Mas para isto acontecer era preciso que sentissem efectivamente alguma vergonha na cara que lhes aguçasse a necessidade de usarem um utensilio que lhes permitisse levantar os olhos do chão e manterem a cabeça erguida quando passam pelos demais cidadãos, ou se dirigem a eles através de um qualquer órgão de comunicação social.
Mas não. Apesar das atrocidades que cometeram no passado e continuam a cometer todos os dias, e não há nenhum partido virgem neste sentido, e mesmo sem o auxílio precioso deste colar que deveriam sentir a necessidade de usar, eles continuam a sorrir, de cabeça bem erguida e ar pomposo, como se nada os pudesse ligar ao estado calamitoso a que chegámos. Mesmo os mais cobardes, vigaristas, corruptos, mentirosos, aldrabões, gente sem um pingo de vergonha a correr-lhes juntamente com o sangue de fraca qualidade nas veias, ostentando sempre a sobranceria que repele o mais andrajoso dos seres vivos pensantes e capazes de destrinçar o bem do mal, parecem sentir qualquer espécie de remorso ou peso na consciência que os faça baixar a testa ao passeio. A falta de vergonha é atroz, quase asfixiante.
Pior: estes senhores não só não usam o colar como o querem enfiar a cada um dos portugueses. Frases como "temos de erguer a cabeça" e "olhar em frente" são o pão nosso de cada dia no discurso destas alminhas que temos de aturar e sustentar. Governo incompetente atrás de governo incompetente, quem usa o colar é sempre o mesmo. O desempregado quando vai ao IEFP à procura de um trabalho, o pensionista quando vai aos CTT receber o cheque miserável, o pai quando olha o filho nos olhos e não o pode ajudar, o filho quando olha o pai nos olhos e lhe pede ajuda. O lojista quando olha na cara o fornecedor e não lhe pode pagar. O empregador que se vê forçado a demitir trabalhadores. O marido que olha para a mulher enquanto fecha a loja pela última vez. Os milhares de pessoas que partem de cabeça erguida à procura de uma vida melhor no estrangeiro. "Emigrem" - dizem eles. Enfim. Usamos o colar porque esta cambada de chulos, de pelintras asquerosos, de sanguessugas incansáveis, destruíram todo um país num abrir e fechar de olhos, para se beneficiarem e beneficiarem os seus pares, patronos e padrinhos financeiros, que lhes fazem festinhas lá do alto dos seus enormes bancos. Para enriquecerem empobrecem tudo e todos à passagem. Uma autêntica política de terra queimada. Fazem tudo para nos levarem a usar o colar mais uma vez. Vale tudo.
Vocês são um verdadeiro nojo. Democrático, mas um nojo.»

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