segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

EXISTE UMA CIDADANIA EUROPEIA?

            Jean Monnet ao afirmar que “ a Europa não se fará sem os Estados e muito menos contra os Estados” estabelece a matriz de um processo gradual de integração que materialmente “jura” preservar e respeitar a identidade política, jurídica e cultural dos Estados membros. A Kompetenz – Kompetenz individual de definição da organização política interna, o respeito biunívoco de Estados e suas fronteiras, o direito e dever de segurança e defesa própria fazem assim parte do quadro político identitário próprio, só passível de ser beliscado por uma espécie de estado de necessidade da própria integração.
No plano da identidade jurídica a harmonização das ordens jurídicas com o direito Comunitário fica sob reserva do carácter próprio dos sistemas jurídicos das mais adelgaçadas soberanias, bem como a identidade cultural que se pretende que acrescente e não subtraia. O princípio do “não excludente” entre princípios da integração e identidade nacional dos Estados é fruto de uma tensão dialéctica, visão dualista ou dialógica, que a putativa cidadania Europeia não excluirá. O valor acrescido do princípio do respeito pela diversidade cultural dos povos europeus, forma extensa do princípio anterior, já bebia também das palavras de Churchill, e da sua visão não paroquial, ao negar a unívoca pretensa da coligação de Estados em detrimento da dos homens. Assim o processo releva de uma inteligente criação de uma nova dimensão de povo, a da coligação dos povos Europeus num espaço alargado, espécie de “maçapão” forjado, em contraposição com o velho povo, conteúdo solitário de uma soberania. Mais que numa cadeia de montagem estandardizada a construção do povo Europeu, parece mais saída de uma manufactura personalizada ou de uma central distribuidora do que de uma fábrica Taylorizada.
O princípio do respeito pela identidade nacional dos Estados membros é um acto pensado que releva dos históricos da integração e dos mecanismos funcionais que propiciassem uma integração não sentida, suave e sem prazo. O processo de globalização, à mistura com muita negociação e bom senso, ajudou a encontrar um caminho de equilíbrio sem rupturas demasiado graves entre “federalistas” e “soberanistas”. A cidadania Europeia foi assim pensada como um acto de reunião e não de intersecção dos povos. O processo económico de integração trás consigo aproximação. Dado que a integração tem um fundo holístico, numa aproximação à teoria sociológica contemporânea, a compressão do espaço pelo tempo e as fronteiras espaço - temporais de Giddens fazem com que sentamos as nossas fronteiras muito mais distantes e dilatadas.
Assim também o reforço da componente democrática de que fala Fausto Quadros. Assim também o problema da cidadania da União que não se pretendeu uma cidadania nova, que afastasse a cidadania estadual. Como ressalva bem Fausto Quadros (p. 115) e como instituí o art.º 20 do Tratado sobre o funcionamento da União Europeia, ex – art.º 17 do Tratado Comunidade Europeia, ao falar na cidadania já não que “complementa” mas que “acresce” e não substituí. 
Salvaguardada, assim, parcelas “respeitosas” da individualidade dos Estados membros, três conclusões são extraídas por Fausto Quadros. Sendo um dos elementos constitutivos de um Estado soberano a existência de um povo com cidadania Estadual própria, não havendo um povo Europeu e um poder constituinte formal próprio, a União não é um Estado. Não existindo a dupla nacionalidade em sobreposição de duas cidadanias, a União não é uma federação. Por fim a confirmação de todo este raciocínio com a função que o tratado CE atribuía ao Parlamento Europeu. Apesar de ser eleito por sufrágio directo e universal, ele não representa o “povo Europeu”, que juridicamente não existe, mas os “povos dos Estados reunidos na Comunidade” (Quadros, 2008, p. 116; 117) - como dispunham, digo bem, dispunham, os artigos 189º e 190º, nº 1, entretanto respectivamente revogado e suprimido. Mãozinha federalista rumo ao futuro, formulação normativa despicienda por duplicação de enunciado e efeito resultante de acção pedagógica – propedêutica direccionada aos responsáveis pela redacção dos textos legislativos ou qualquer outro objectivo não alcançado por um pobre estudante de Estudos Europeus?  
Reflexão conclusiva final aponta para que, o princípio do respeito pela identidade nacional dos Estados membros não excluiu em definitivo, antes abre por pertença ao outro a possibilidade de uma cidadania Europeia com direitos específicos, de circulação, permanência, eleição, protecção, petição e queixa, no designado espaço da União. Uma meia construção material Constitucional, que espera “formal e imperialmente” melhores dias. Afinal supranacionalidade e cooperação fazem, por enquanto, parte da espuma dos dias!

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