segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

O QUE SÃO AS ATRIBUIÇÕES CONCORRENTES?

Fausto Quadros é claro no seu manual ao afirmar que o “estudo das atribuições da Comunidade significa o estudo do modo como os Tratados procedem à repartição de atribuições entre a Comunidade e os Estados” (p. 192). Fins, meios, matérias substantivas, atribuições e competências, funcionam como uma espécie de conceitos natais e operadores seminais que nos focam no essencial. Na tensão dialéctica entre a integração e a interestadualidade, integração e soberania, as sementes do jardim Europeu regadas pelo método funcional germinaram, a espaços, dando vida a um jardim plural e repartido pelos operadores.
Os três degraus, ou patamares, de que fala Quadros no sistema de repartição das atribuições, matérias nas quais intervêm a União e os Estados membros, são assim preenchidos não só pelo princípio da especialidade das atribuições, como pela definição das atribuições exclusivas e das concorrentes. “Puxado” do Eurocid, o nº 5, parágrafo 1 e 2 do articulado do Tratado da União Europeia, estabelece não só os limites das atribuições ou matérias, como a regra e a excepção, sinónimos da concorrência ou da exclusividade, no sistema vertical de repartição de atribuições entre União e Estados membros.
Se até ao Tratado de Lisboa as atribuições exclusivas não eram explicitadas, abrangendo matérias já comunitarizadas - dada a absorção dos poderes soberanos dos Estados membros - com Lisboa, o Tratado sobre o funcionamento da União Europeia titula no seu n.º 1 as categorias e domínios de competência da União, explicitando no art.º 3, os domínios da competência exclusiva da União.
Assim, “todas as atribuições que caibam no princípio da especialidade da União e que não se tenham tornado exclusivas da União, esta e os Estados Membros concorrem entre si …” (Quadros, 2008, p. 197).
Repartidas, previamente, as atribuições entre União e Estados membros, coloca-se o problema de disciplinar o exercício das atribuições repartidas, partilhadas ou concorrentes, “regência” que é atribuída ao princípio da subsidiariedade, esse princípio historicamente conotado com as encíclicas “Quadragesimo” a “Centesimus annus” de Pio XII a João Paulo II, esse elemento de bem comum e disciplinador da concorrência, como regra, na repartição vertical das atribuições entre a União e os Estados membros.
Princípio não meramente político ou programático, mas princípio jurídico, regra de direito, princípio filosófico descentralizador como lembra (Quadros, 2008, p. 201) ao serviço não só de crentes, mas de outros usuários singulares ou colectivos.
Princípio que impõe a maior aproximação do poder de decisão na sua relação com os cidadãos e que não deve ser confundido com a criação de novos poderes para os órgãos da União. Introduzido com Maastricht e “protocolado” no número 7 anexo ao Tratado de Amesterdão, promovido com o seu irmão “proporcionalidade” a número 2 - esse princípio geral de Direito travão de excessos na acção - o não “meramente político” anterior, não lhe retira o grande alcance político, dando até “pleonasticamente” sentido à nossa reflexão sobre “o sentido das atribuições concorrentes no Direito da União Europeia”.
Relativização do âmbito da soberania na assunção das perdas ou ganhos, quase como um espelho ou uma almofada amortecedora de sensibilidades anti-federalistas; versão “consciência e assunção das suas próprias capacidades ou fragilidades”; reconstrução, na construção, de novos equilíbrios.
A reforçada exigência de demonstração de intervenção com a cumulação entre a maior eficácia comunitária e a demonstração da insuficiência da actuação Estadual; a própria reversibilidade da subsidiariedade em tudo o que não seja já domínio comunitarizado parece, assim e também, ir no sentido paralelo ao sentido das atribuições concorrentes, na via do princípio da salvaguarda da identidade nacional.
O sentido das atribuições concorrentes concorrem elas próprias, assim, para o aprofundar de uma Europa de tipo novo, uma União de povos, Estados e cidadãos tentando preservar na construção lenta e segura o acervo edificado, dos tremores e temores de uma Europa de muitas vozes e muitas “cores”. A explicitação dos domínios exclusivos e concorrentes entre União e Estados membros parece, no entanto, colocar uma lança em África, enquanto afaga a várias mãos o directório de tigres que gostava de rosnar a solo.

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