sexta-feira, 5 de março de 2010

O QUE ALGUNS TEIMAM EM NÃO QUERER VER

«Um extraordinário livro, acabado de sair, "The Spirit Level"* mostra-o claramente. Para um grupo de vinte e três países desenvolvidos analisados, quanto mais igualitárias são as sociedades menos intensos são os problemas sociais e mais elevada é a qualidade de vida, concebida de forma ampla. O rendimento per capita é irrelevante neste contexto.

Richard Wilkinson e Kate Pickett, dois dos mais reputados especialistas internacionais na área dos determinantes sociais da saúde, não só sistematizam na obra décadas de investigação empírica, que há muito mostrou que os países mais desiguais têm, globalmente e para os vários escalões sociais, piores resultados na área da saúde pública e níveis muito superiores de sofrimento social evitável, como alargam o leque das relações abordadas: da população prisional aos níveis de confiança, passando pelos resultados escolares.

Como bons cientistas sociais, os autores não confundem correlação com causalidade. A sua análise estatística mostra um padrão claro de associação entre cada um dos problemas abordados e as diferenças entre ricos e pobres, mostrando também que nenhuma outra variável exibe o mesmo comportamento. Este é um ponto de partida para uma detalhada exploração dos mecanismos causais que permitem, para além de qualquer dúvida razoável, dizer que as desigualdades de rendimentos são a principal causa dos problemas escrutinados.

De outra forma, como explicar que países tão diferentes como Portugal, os EUA ou o Reino Unido exibam uma performance tão medíocre em termos de indicadores sociais e que o Japão ou a Suécia, países infinitamente mais igualitários, sejam sociedades bem mais decentes?

Os autores dão uma grande importância à forma como as desigualdades de rendimento criam um filtro que dificulta as relações sociais entre os indivíduos, que aumenta a conflitualidade e o preconceito de classe e que impede a descoberta de soluções cooperativas, a descoberta de regras e de instituições comuns, que são a base material do florescimento humano.

Sabemos que o desempenho dos indivíduos é, em larga medida, o resultado das suas circunstâncias sociais. As sociedades menos desiguais mostram como estas se podem tornar mais humanas. Por isso, apelo ao leitor que esteja atento. Os movimentos sociais e os partidos políticos que pugnam por políticas de maior igualdade das condições materiais estão a contribuir, sobretudo em épocas de crise, para que o leitor possa viver mais e melhor. A evidência empírica não mente. A política que importa tem de se basear nela.»

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