«O cão e a raposa
Por João Duque
ERA UMA VEZ, no tempo em que os animais falavam, um bosque muito bonito onde habitavam em perfeita harmonia todos os bichinhos da região: coelhos e coiotes, galinhas e raposas, perdizes e cães de caça.
Um dia, os lenhadores que por lá passaram, deixaram uma tabuleta pregada numa das árvores da periferia com o seguinte texto: "Estado Social". E os animais começaram a chamar ao bosque Estado Social. Um dia resolveram eleger um dos animais para dirigir os trabalhos de limpeza e manutenção da floresta. Candidataram-se ao cargo a raposa e o cão.
A raposa começou a campanha prometendo que a floresta ia ser limpa sem requerer qualquer esforço, porque o vento, ao soprar como de costume, se encarregaria de varrer o lixo não sendo pois necessário que qualquer animal tivesse de levantar uma pata ou morder um saco de plástico. Os animais, delirantes, apoiavam as atraentes ideias da raposa sublinhando com vivas e olés as delícias apresentadas. Entusiasmada, a raposa prometia mais: "- Garanto que podemos ter manjares com que nem sonham e iguarias inimagináveis no Estado Social!" A bicharada, encantada, rejubilava com mais olés e vivas.
O cão, acabrunhado, e pressentindo que não era possível manter tais promessas, repetia a sua receita: "- Se trabalharmos muito talvez se consiga o necessário para nos mantermos. O bosque encolhe todos os anos e nem sei se amanhã vamos todos manter o Estado Social, quero dizer, o bosque que temos hoje...". Fez-se a votação. Ganhou a raposa.
A cada novo dia que passava a raposa continuava a proclamar o bem que se vivia no Estado Social, embora todos os dias caísse mais uma árvore e se reduzisse o Estado Social. Passados uns meses, o cão, entristecido e preocupado com a redução do tamanho do bosque, voltou a falar aos animais: "- Eu não sei se vamos todos ter o espaço e as condições que temos hoje no Estado Social. Talvez devêssemos rever as regras do bosque e pedir aos animais mais poderosos para começarem a procurar comida e refúgio fora do Estado Social..."
Os coiotes, amigos da raposa, furiosos, começaram por insultar o cão acusando-o de uma infame campanha contra a vida no Estado Social. Ele, cão, deveria saber que os seus pais lhe deixaram em herança o Estado Social que deveria manter com fé. Passados dias, com a chegada do inverno, o frio atacou cortante e sem dó. Para responder à crise provocada pela intempérie, a raposa mandou cortar metade do Estado Social para mandar queimar as árvores e com a fogueira aquecer os animais enregelados. O cão ainda bradou que tinha previsto que isso ia suceder e que o Estado Social era agora metade do que já tinha sido. Mas a raposa e os seus amigos coiotes começaram a rosnar dizendo que os seus ruidosos protestos atrairiam os homens que lhe trariam a morte.
Final da história: a) o cão, a bem da bicharada, conteve a ira e calou-se; b) o cão, a bem da bicharada, mordeu ferozmente a raposa, e expulsou-a.
Como devo concluir a fábula?
Pede-nos João Duque a conclusão da fábula.
Como não encontramos a terceira hipótese excluída, aqui vai:
a raposa e os seus amigos coiotes atiraram-se a todos os bichinhos do bosque tosquiando-lhes o pêlo e apropriando-se da sua gordura - que enviavam satisfeitos para o certinho e Angélico bosque vizinho - enquanto expulsavam os mais destemidos do bosque encantado.
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