1. Caracterize o princípio do respeito pela identidade nacional dos Estados membros, reflectindo, em simultâneo, sobre a possibilidade de existência de uma cidadania europeia.
Jean Monnet ao afirmar que “ a Europa não se fará sem os Estados e muito menos contra os Estados” estabelece a matriz de um processo gradual de integração que materialmente “jura” preservar e respeitar a identidade política, jurídica e cultural dos Estados membros. A Kompetenz – Kompetenz individual de definição da organização política interna, o respeito biunívoco de Estados e suas fronteiras, o direito e dever de segurança e defesa própria fazem assim parte do quadro político identitário próprio, só passível de ser beliscado por uma espécie de estado de necessidade da própria integração.
No plano da identidade jurídica a harmonização das ordens jurídicas com o direito Comunitário fica sob reserva do carácter próprio dos sistemas jurídicos das mais adelgaçadas soberanias, bem como a identidade cultural que se pretende que acrescente e não subtraia. O princípio do “não excludente” entre princípios da integração e identidade nacional dos Estados é fruto de uma tensão dialéctica, visão dualista ou dialógica, que a putativa cidadania Europeia não excluirá. O valor acrescido do princípio do respeito pela diversidade cultural dos povos europeus, forma extensa do princípio anterior, já bebia também das palavras de Churchill, e da sua visão não paroquial, ao negar a unívoca pretensa da coligação de Estados em detrimento da dos homens. Assim o processo releva de uma inteligente criação de uma nova dimensão de povo, a da coligação dos povos Europeus num espaço alargado, espécie de “maçapão” forjado, em contraposição com o velho povo, conteúdo solitário de uma soberania. Mais que numa cadeia de montagem estandardizada a construção do povo Europeu, parece mais saída de uma manufactura personalizada ou de uma central distribuidora do que de uma fábrica Taylorizada.
O princípio do respeito pela identidade nacional dos Estados membros é um acto pensado que releva dos históricos da integração e dos mecanismos funcionais que propiciassem uma integração não sentida, suave e sem prazo. O processo de globalização, à mistura com muita negociação e bom senso, ajudou a encontrar um caminho de equilíbrio sem rupturas demasiado graves entre “federalistas” e “soberanistas”. A cidadania Europeia foi assim pensada como um acto de reunião e não de intersecção dos povos. O processo económico de integração trás consigo aproximação. “Usando pedaços de estudo” de outras UL, dado que a integração tem um fundo holístico, numa aproximação à teoria sociológica contemporânea, a compressão do espaço pelo tempo e as fronteiras espaço - temporais de Giddens fazem com que sentamos as nossas fronteiras muito mais distantes e dilatadas.
Assim também o reforço da componente democrática de que fala Fausto Quadros. Assim também o problema da cidadania da União que não se pretendeu uma cidadania nova, que afastasse a cidadania estadual. Como ressalva bem Fausto Quadros (p. 115) e como instituí o art.º 20 do Tratado sobre o funcionamento da União Europeia, ex – art.º 17 do Tratado Comunidade Europeia, ao falar na cidadania já não que “complementa” mas que “acresce” e não substituí.
Salvaguardada, assim, parcelas “respeitosas” da individualidade dos Estados membros, três conclusões são extraídas por Fausto Quadros. Sendo um dos elementos constitutivos de um Estado soberano a existência de um povo com cidadania Estadual própria, não havendo um povo Europeu e um poder constituinte formal próprio, a União não é um Estado. Não existindo a dupla nacionalidade em sobreposição de duas cidadanias, a União não é uma federação. Por fim a confirmação de todo este raciocínio com a função que o tratado CE atribuía ao Parlamento Europeu. Apesar de ser eleito por sufrágio directo e universal, ele não representa o “povo Europeu”, que juridicamente não existe, mas os “povos dos Estados reunidos na Comunidade” (Quadros, 2008, p. 116; 117) - como dispunham, digo bem, dispunham, os artigos 189º e 190º, nº 1, entretanto respectivamente revogado e suprimido. Mãozinha federalista rumo ao futuro, formulação normativa despicienda por duplicação de enunciado e efeito resultante de acção pedagógica – propedêutica direccionada aos responsáveis pela redacção dos textos legislativos ou qualquer outro objectivo não alcançado por um pobre estudante de Estudos Europeus?
Reflexão conclusiva final aponta para que, o princípio do respeito pela identidade nacional dos Estados membros não excluiu em definitivo, antes abre por pertença ao outro a possibilidade de uma cidadania Europeia com direitos específicos, de circulação, permanência, eleição, protecção, petição e queixa, no designado espaço da União. Uma meia construção material Constitucional, que espera “formal e imperialmente” melhores dias. Afinal supranacionalidade e cooperação fazem, por enquanto, parte da espuma dos dias!
2. Caracterize e reflicta sobre o sentido das atribuições concorrentes no Direito da União Europeia.
Fausto Quadros é claro no seu manual ao afirmar que o “estudo das atribuições da Comunidade significa o estudo do modo como os Tratados procedem à repartição de atribuições entre a Comunidade e os Estados” (p. 192). Fins, meios, matérias substantivas, atribuições e competências, funcionam como uma espécie de conceitos natais e operadores seminais que nos focam no essencial. Na tensão dialéctica entre a integração e a interestadualidade, integração e soberania, as sementes do jardim Europeu regadas pelo método funcional germinaram, a espaços, dando vida a um jardim plural e repartido pelos operadores.
Os três degraus, ou patamares, de que fala Quadros no sistema de repartição das atribuições, matérias nas quais intervêm a União e os Estados membros, são assim preenchidos não só pelo princípio da especialidade das atribuições, como pela definição das atribuições exclusivas e das concorrentes. “Puxado” do Eurocid, o nº 5, parágrafo 1 e 2 do articulado do Tratado da União Europeia, estabelece não só os limites das atribuições ou matérias, como a regra e a excepção, sinónimos da concorrência ou da exclusividade, no sistema vertical de repartição de atribuições entre União e Estados membros.
Se até ao Tratado de Lisboa as atribuições exclusivas não eram explicitadas, abrangendo matérias já comunitarizadas - dada a absorção dos poderes soberanos dos Estados membros - com Lisboa, o Tratado sobre o funcionamento da União Europeia titula no seu n.º 1 as categorias e domínios de competência da União, explicitando no art.º 3, os domínios da competência exclusiva da União.
Assim, “todas as atribuições que caibam no princípio da especialidade da União e que não se tenham tornado exclusivas da União, esta e os Estados Membros concorrem entre si …” (Quadros, 2008, p. 197).
Repartidas, previamente, as atribuições entre União e Estados membros, coloca-se o problema de disciplinar o exercício das atribuições repartidas, partilhadas ou concorrentes, “regência” que é atribuída ao princípio da subsidiariedade, esse princípio historicamente conotado com as encíclicas “Quadragesimo” a “Centesimus annus” de Pio XII a João Paulo II, esse elemento de bem comum e disciplinador da concorrência, como regra, na repartição vertical das atribuições entre a União e os Estados membros.
Princípio não meramente político ou programático, mas princípio jurídico, regra de direito, princípio filosófico descentralizador como lembra (Quadros, 2008, p. 201) ao serviço não só de crentes, mas de outros usuários singulares ou colectivos.
Princípio que impõe a maior aproximação do poder de decisão na sua relação com os cidadãos e que não deve ser confundido com a criação de novos poderes para os órgãos da União. Introduzido com Maastricht e “protocolado” no número 7 anexo ao Tratado de Amesterdão, promovido com o seu irmão “proporcionalidade” a número 2 - esse princípio geral de Direito travão de excessos na acção - o não “meramente político” anterior, não lhe retira o grande alcance político, dando até “pleonasticamente” sentido à nossa reflexão sobre “o sentido das atribuições concorrentes no Direito da União Europeia”.
Relativização do âmbito da soberania na assunção das perdas ou ganhos, quase como um espelho ou uma almofada amortecedora de sensibilidades anti-federalistas; versão “consciência e assunção das suas próprias capacidades ou fragilidades”; reconstrução, na construção, de novos equilíbrios.
A reforçada exigência de demonstração de intervenção com a cumulação entre a maior eficácia comunitária e a demonstração da insuficiência da actuação Estadual; a própria reversibilidade da subsidiariedade em tudo o que não seja já domínio comunitarizado parece, assim e também, ir no sentido paralelo ao sentido das atribuições concorrentes, na via do princípio da salvaguarda da identidade nacional.
O sentido das atribuições concorrentes concorrem elas próprias, assim, para o aprofundar de uma Europa de tipo novo, uma União de povos, Estados e cidadãos tentando preservar na construção lenta e segura o acervo edificado, dos tremores e temores de uma Europa de muitas vozes e muitas “cores”. A explicitação dos domínios exclusivos e concorrentes entre União e Estados membros parece, no entanto, colocar uma lança em África, enquanto afaga a várias mãos o directório de tigres que gostava de rosnar a solo.
1 comentário:
Nunca europeia, porque a europa matou todas as minhas gentes. Sempre inuit. Nunca Europa
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